terça-feira, 23 de outubro de 2012

Milho de Pipoca

"Milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho para sempre. 

Assim acontece com a gente. 

As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo.
Quem não passa pelo fogo, fica do mesmo jeito a vida inteira. São pessoas de uma mesmice e uma dureza assombrosas. Só que elas não percebem e acham que seu jeito de ser é o melhor jeito de ser. Mas, de repente, vem o fogo.
O fogo é quando a vida nos lança numa situação que nunca imaginamos: a dor.
Pode ser fogo de fora: perder um amor, perder um filho, o pai, a mãe, perder o emprego ou ficar pobre.  Pode ser fogo de dentro: pânico, medo, ansiedade, depressão ou sofrimento, cujas causas ignoramos.


Há sempre o recurso do remédio: apagar o fogo! 

Sem fogo, o sofrimento diminui. 
Com isso, a possibilidade da grande transformação também.

Imagino que a pobre pipoca, fechada dentro da panela, lá dentro cada vez mais  quente, pensa que sua hora chegou: vai morrer.
Dentro de sua casca dura, fechada em si mesma, ela não pode imaginar um destino diferente para si.Não pode imaginar a transformação que está sendo preparada para ela. A pipoca não imagina aquilo de que ela é capaz. Aí, sem  aviso prévio, pelo poder do fogo a grande transformação acontece: BUM!


E ela aparece como uma outra coisa completamente diferente, algo que ela mesma nunca havia sonhado. Bom, mas ainda temos o piruá, que é o milho de pipoca que se recusa a estourar.
São como aquelas pessoas que, por mais que o fogo esquente, se recusam a mudar. Elas acham que não pode existir coisa mais maravilhosa do que o jeito delas serem. 
A presunção e o medo são a dura casca do milho que não estoura. No  entanto, o destino delas é triste, já que ficarão duras, a vida inteira. Não vão se transformar na flor branca, macia e nutritiva. Não vão dar alegria para ninguém.

Em vez de sofrer pelas modificações que ainda não consegue, sinta-se grato pelas mudanças que já realizou."

Rubem Alves 

Extraído do livro "O amor que acende a lua".  

 

 

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